‘O CAPITAL NO SÉCULO 21’
O fenômeno Thomas Piketty
Por Alberto Dines
Editorial do programa Observatório da Imprensa na TV nº 727, exibido em 3/6/2014
Muito mais do que um extraordinário fenômeno editorial, a repercussão do livro do jovem economista francês Thomas Piketty – O capital no século 21
– tem a ver com o seu inspirador, Karl Marx, e com os preconceitos que o
filósofo alemão desperta nas elites econômicas e políticas há 137 anos,
quando publicou o primeiro volume do O Capital, a obra mais proibida dos últimos séculos.
Mas o que alavanca o entusiasmo em torno de Piketty, tornando-o
instantaneamente uma estrela de primeira grandeza no cenáculo mundial,
são as conclusões que procurou comprovar cientificamente: Marx está
correto, as desigualdades tendem a eternizar-se, na medida em que a
riqueza mantém-se sólida, não se distribui.
Piketty não é um carbonário, é um marxista moderado, militante do
Partido Socialista francês, que está sendo recebido com o maior respeito
por publicações notoriamente conservadoras como o Wall Street Journal e The Economist, este do mesmo grupo que edita o Financial Times, que tenta corrigir suas premissas e estatísticas. Em vão.
A chave final para explicar o fenômeno Piketty é a afirmação nas
primeiras páginas da introdução: “A economia é algo sério demais para
ficar exclusivamente nas mãos dos economistas e cientistas sociais”. A
economia concerne a todos. Piketty está parafraseando o político francês
George Clemanceau, que chocou os generais durante a Primeira Guerra
Mundial ao dizer que “a guerra é séria demais para ficar apenas nas mãos
dos militares”.
A inédita democratização do debate econômico tem a ver com a profissão dos principais players
desta história: Marx foi jornalista e dono de jornais na velha Prússia;
perseguido e silenciado, acabou como articulista do maior jornal
americano na segunda metade do século 19, o New York Daily Tribune. Durante onze anos escreveu 350 artigos, alguns em parceria com Friederich Engels, e assim sobreviveu com relativo conforto.
Piketty é colunista mensal do Libération e ocasionalmente colabora com o Le Monde. E seu principal suporte é Paul Krugman, Nobel de economia e articulista regular do New York Times.
Comprovado: a distribuição da riqueza é também tarefa da imprensa livre.


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