Daniel Guimarães, Graziela Kunsch, Mariana Toledo e
Luiza Mandetta: Rumo à tarifa zero
Há pouco, escrevemos sobre os motivos
que nos levaram às ruas. O aumento de R$ 0,20 nas tarifas acentuaria a exclusão
social provocada por um modelo de gestão do transporte baseado nas concessões
privadas e na cobrança de tarifa.
Após duas semanas de luta, a população
de São Paulo revogou o aumento. Resistimos à desqualificação dos meios de
comunicação, bombas, balas e prisões arbitrárias.
Isso não fugiu à regra do tratamento
que o Estado dá aos movimentos sociais. É importante que o Judiciário reconheça
a ilegalidade das acusações que pesam sobre alguns dos detidos, entre elas a de
formação de quadrilha. E que o Ministério Público reconheça a arbitrariedade da
polícia e se recuse a oferecer denúncias contra manifestantes, evitando
processos criminais.
Foi uma vitória das ruas, de esquerda e
pedagógica, que ensinou que a população organizada pode mudar os rumos de sua
cidade e, por consequência, de sua vida. Tarifas foram reduzidas em quase 50
cidades, sendo mais de dez capitais. Há lutas em andamento, e o debate sobre a
tarifa zero está em pauta.
Por conta desse cenário e por
contribuirmos ao pensar a mobilidade urbana como forma de garantir o direito à
cidade, fomos convidados pela presidenta Dilma Rousseff para uma conversa em
Brasília. Fomos, mas não sozinhos. Sem sermos porta-vozes de ninguém que não
nós mesmos, manifestamos solidariedade às lutas reprimidas de outros movimentos
e de povos indígenas.
A presidenta não havia se debruçado com
profundidade sobre nossa principal proposta. Ao afirmar que "não existe
tarifa zero: ou se paga passagem ou se paga imposto", ignora que nunca
defendemos ônibus de graça. Transporte tem um custo, claro, mas a tarifa pode
ser zero.
Esse custo deve ser pago coletivamente,
de forma progressiva (quem tem mais paga mais, quem tem menos paga menos) e não
apenas pelo usuário. Sem transporte, nada funciona e, por isso, a conta deve
ser dividida por meio de impostos, como todos os serviços públicos.
Dilma ao menos demonstrou concordar que
o transporte é um direito social e cobramos um posicionamento sobre a PEC 90,
proposta de emenda constitucional que insere o transporte público entre os
direitos sociais no artigo 6º da Constituição, em tramitação na Câmara.
Dilma reiterou sua disposição em
políticas de desoneração, pauta histórica dos empresários organizados. Não
concordamos. Desonerar é fazer com que o Estado deixe de arrecadar, subsidiando
empresas privadas, não a população. O dinheiro público deve ser investido em
transporte público --queremos disputar o uso dos recursos. Com o que o Estado
gasta? De acordo com o Ipea, o Brasil investe 12 vezes mais em transporte
privado do que em público. Devemos inverter as prioridades!
Finalmente, consideramos oportuna a
decisão do prefeito Fernando Haddad de suspender a licitação das empresas de
ônibus. É preciso abrir a caixa-preta, com ou sem CPI, e, sobretudo, é urgente
discutir o modelo de gestão.
É significativa a informação de que os
empresários ameaçaram boicotar a licitação e até deixar a cidade com menos
ônibus por avaliar que perderiam cerca de 10% de seus rendimentos. É por isso
que o transporte deve ser gerido pelo poder público e com participação popular,
não pela lógica do lucro.
O Movimento Passe Livre seguirá nas
ruas, nas escolas, nos bairros, fazendo o debate com a população. Nossa luta de
fôlego é pela tarifa zero. Por ela coletaremos 430 mil assinaturas para propor
um projeto de lei de iniciativa popular na Câmara dos Vereadores. Vamos retirar
as catracas do caminho. Juntos abriremos as ruas de São Paulo.
DANIEL
GUIMARÃES, 29, jornalista, GRAZIELA
KUNSCH, 34, artista, MARIANA
TOLEDO, 27, socióloga, e LUIZA
MANDETTA, 19, estudante de ciências sociais,
são militantes do Movimento Passe Livre


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