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segunda-feira, 8 de novembro de 2010

E agora Maria? (II)

E agora, Dilma?

    A eleição acabou, a luz apagou, o povo decidiu. Agora Dilma tem pela frente a 
    pressão dos movimentos sociais com uma agenda política contrária em diversos ponto
 Eduardo Sales de Lima - do Brasil de Fato

Eleita com 56% dos votos válidos, a futura presidenta brasileira Dilma Rousseff enfrentará,
 a partir de janeiro do ano que vem, o desafio de manter o crescimento econômico em
 meio à resolução de problemas estruturais e sociais recorrentes. A marca da ex-guerrilheira,
 na opinião do presidente do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea),
 Marcio Pochmann, é a social-desenvolvimentista.
“[Tal marca] é algo identificado a partir da própria concepção do PAC [Programa 
de Aceleração do Crescimento]”, lembra. De acordo com ele, o PAC sempre esteve atrelado, 
não por acaso, à figura de Dilma; e foi concebido para impulsionar “o crescimento
 econômico com o compromisso da superação da miséria”.
Tal crescimento, no entanto, ainda será regido pela ingerência econômica exterior, 
e não simplesmente pelo impulso das obras do futuro governo federal. Isso de
 acordo com o sociólogo e professor da Universidade Federal de Rondônia (Unir),
 Luis Fernando Novoa Garzon. Para ele, essa dependência do mercado externo 
ocorrerá por força das próprias “peças” que acompanham Dilma. “A depender de 
agentes como o ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e Paulo Bernardo 
Silva (atual ministro do Planejamento), tidos como peças-chave no futuro governo,
 a patrulha dos mercados sobre os limites da política doméstica não irá diminuir”, 
explica.

Herança 1
Se essa for mesmo a vontade de Dilma, a de impulsionar a economia brasileira com 
ações que beneficiem a sociedade brasileira como um todo, ela terá a oportunidade
 de utilizar, como matéria-prima para esse crescimento, a melhoria dos serviços 
públicos sucateados, principais gargalos sociais herdados do governo Lula. Os setores 
de saúde de educação são apenas dois exemplos.
“Os sistemas públicos de saúde e educação, apesar de muito bem concebidos
 na Constituição e na legislação complementar no fim dos anos 1980, não foram 
implementados e seu sucateamento prosseguiu nos dois mandatos de Lula,
 a despeito do avanço de programas isolados”, cita Luis Fernando Novoa Garzon.
Para ele, não se pode dizer que esses serviços sejam públicos quando a qualidade
 mínima exigida se obtém somente quando se contrata planos privados de saúde
 ou se recorre às redes particulares de ensino. “O descalabro do Sistema Único 
de Saúde [SUS] e da rede pública de ensino continuam sendo um estímulo
 governamental indireto à expansão da oferta privada desses serviços essenciais”,
 aponta Novoa.

Herança 2
Outro eixo que conforma os principais desafios de Dilma para os próximos 
quatro anos, de acordo com o escritor e teólogo Leonardo Boff, será o de
 retomar mais fortemente uma parte da agenda que elegeu Lula: a 
ética e as reformas estruturais. “As reformas estruturais formam a dívida que o
 governo Lula nos deixou. Não teve condições, por falta de base parlamentar 
segura, de fazer nenhuma das reformas prometidas: a agrária, a fiscal e a política”,
 afirmou Boff, em artigo.
Para ele, a reforma fiscal (tributária) deve estabelecer uma equidade mínima 
entre os contribuintes, pois, até agora, os impostos poupam os ricos e oneram
 pesadamente os assalariados. Ele lembra, ainda, que a reforma agrária 
não é satisfeita apenas com assentamentos. “Deve ser integral e popular, 
levando democracia para o campo e aliviando a favelização das cidades”, conclui.
Segundo César Sanson, sociólogo e pesquisador do Centro de Pesquisa e Apoio
 aos Trabalhadores (Cepat), “tudo indica que teremos uma reforma tributária, sob 
a perspectiva popular, meia-sola”. Quanto à reforma política, Sanson pondera que
 essa não está na pauta e nas prioridades de um governo Dilma. “Ela sequer
 interessa aos partidos políticos. Virou um tema de retórica política, todos se 
dizem a favor, mas nada fazem para que avance porque mexe nos interesses
 dos caciques políticos de todos os partidos”, afirma. Ele acredita que uma 
verdadeira reforma política vem, sim, da sociedade organizada, como por exemplo, 
com a iniciativa popular do projeto de lei da Ficha Limpa.

Mais do mesmo”
Mas, para se consolidar como uma governante social-desenvolvimentista, para 
ampliar ou até mesmo manter o orçamento para a área de serviços públicos, e 
para, de fato, realizar reformas estruturantes em seu governo, Dilma Rousseff 
precisará contar com a chamada governabilidade, ou seja, com o apoio do
 Congresso Nacional.
Nos próximos quatro anos, o Parlamento será povoado por uma maioria governista
 – 311 deputados dos 513 e 59 dentre os 81 senadores.
O que não quer dizer, necessariamente, algo positivo. Isso porque, de
 acordo com Novoa, a maioria congressual que serviu a Lula por oito anos
 em nenhum momento funcionou para avançar reformas de caráter democrático
 e popular. “A própria forma de costurar apoios para a candidatura oficial, 
através do direcionamento de recursos federais para as máquinas políticas 
respectivas em cada estado, faz crer que essa confortável base congressual
 terá sempre que ser azeitada com mais do mesmo”, afirma.
Para ele, a presença contraditória de uma figura como Michel Temer (PMDB) 
na Vice-Presidência da República elucida a “entronização e institucionalização
 dessa prática fisiológica”. “A pulverização e o loteamento dos recursos públicos
 impede a construção de políticas estruturantes e retira o necessário protagonismo 
da população na sua condução. Michel Temer será, na prática, um superministro 
de articulação política, centralizando o intercâmbio de favores entre Executivo e
 Legislativo”, aponta Novoa.
César Sanson, por sua vez, vislumbra uma relação tensa entre governo e PMDB. 
Para ele, o partido promete ser voraz por espaço para atender a sua federação
 fisiológica de caciques. “O PMDB é o DEM [Democratas] do PT. O partido 
exigirá mais espaço do que no governo Lula, e Dilma terá que ter muita habilidade 
para administrar a sede por poder desse partido”, salienta.
Para contrapor tal fisiologismo partidário e outras mazelas emergidas a partir
 da chamada governabilidade, a deputada federal recém-eleita pelo Partido 
Socialista Brasileiro (PSB) de São Paulo, Luiza Erundina, acredita que o 
governo Dilma terá que enfrentar o desafio de democratizar o Estado brasileiro 
cavando o espaço para diálogo com a sociedade organizada. “É mais do 
que os resultados, é a forma de dividir o poder, a necessidade da relação com
 a sociedade civil”, afirma.
Ela espera que o futuro governo se volte, desde o primeiro momento, para
 o que chama de “participação popular organizada e politizada”. 
“Lamentavelmente, não tivemos isso no governo Lula”, conclui.
 (Colaboraram Patrícia Benvenuti e Pedro Carrano)

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